segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Desarmar quem e para quê?

Acabo de ver, no Jornal Nacional, uma matéria referente a entregar armas. Reconheço que não vi a matéria toda, mas peguei o final onde uma pesquisadora afirmava que se o cidadão entregar suas armas consegue, com isso, ajudar na diminuição da violência. Notório é que a memória do cidadão brasileiro é curta, que dirá inexistente, em relação a campanha do desarmamento que tornou-se famosa ao publico no ano de 2004/2005. Como tenho um pavor de grandes proporções dessa campanha e dessa idéia absolutamente equivocada de que o desarmamento do cidadão irá colaborar para a diminuição da violência, que não pensei duas vezes em vir até aqui, e publicar neste espaço que me compete um texto meu da época em que participei do movimento estudantil, com vistas em esclarecer essa falácia. Eu reconheço que muita gente que abrir este blog não irá ler este post até o final, pois todos temos coisas muito mais importantes pra fazer, do que preocupar com desarmamento. Mas peço, encarecidamente, que façam um esforço de ler, ou mesmo, procurem saber do assunto, pois ao sermos analfabetos políticos, estamos negando a nós mesmos um direito que nos cabe de sermos sujeitos de nossa própria história. Quero lembrar a vocês que a História mostra que Estados totalitários fizeram campanhas de desarmamento para conseguir seus objetivos econômicos e políticos. Como Alemanha, que desarmou todos os judeus, ciganos, negros, deficientes físicos e homossexuais antes de seqüestrá-los para os campos de concentração, com a vantagem de que não reagiriam e nem se defenderiam por estarem desarmados. Quero lembrar que União Soviética, nas mãos de Stalin, desarmou os perseguidos políticos a fim de que não houvesse resistência. TODO estado totalitário e anti-democrático se interessa em desarmar a sua população. Peço, por favor, que estejam atentos ao que ocorre em seu próprio país. Em seguida, o texto que escrevi ainda na universidade que, embora tenha sido escrito na época da campanha, se faz tão contemporâneo quanto na época em que foi distribuído no campus da universidade:

Desarmar Quem? Para Quê?

Por Joyce Garófalo
CAHIS - Gestão Convicção

Desde a data de 23 de Dezembro do ano de 2003 começou a vigorar a Lei 10.826, de 22 de Dezembro do mesmo ano conhecida como Estatuto do Desarmamento. No dia 02 de Julho de 2004 o decreto que a regulamentou, no 5.123 de 01/07/2004, foi publicado no Diário Oficial da União e passou a vigorar naquela data.
Segundo o próprio Luiz Inácio Lula da Silva, Presidente da República, “A partir da aprovação da nova lei, o controle das armas foi centralizado na União, a cargo da Polícia Federal e do Comando do Exército. Portarias dos dois ministérios reforçaram restrições e controles definidos pela lei, como o uso e compra de armas e munições.” Folha de S. Paulo, 09/10/2005.
As restrições, sem dúvida, foram reforçadas. O Certificado de Registro de Arma de Fogo, válido por todo o território nacional, autoriza seu proprietário a manter a sua arma exclusivamente no interior de sua residência. Além disso, os requisitos para a renovação do certificado devem ser comprovados periodicamente. O civil, no entanto, tem direito ao registro, mas não ao porte de arma (exceto o civil com porte concedido pela Polícia Federal). O registro é o documento da arma que contém todos os dados referentes à mesma. O porte é a autorização para que o proprietário circule armado. Esta autorização, no entanto, só passa a valer para os integrantes das Forças Armadas, policiais, agentes de inteligência e agentes de segurança privada.
A lei consta, ainda, que o civil com pretensão de obter uma arma legal, para mantê-la em seu domicílio, deve ter idade mínima de 25 anos. Deve também declarar sua real necessidade de possui-la, apresentar certidões e antecedentes criminais, não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, apresentar documento que comprove sua ocupação lícita e residência certa, comprovar sua capacidade técnica e aptidão psicológica para o manuseio de armas. Só após o cumprimento de todos esses requisitos o interessado receberá sua autorização para comprar e registrar uma arma.
As penas para porte de arma ilegal aumentaram e quem for pego andando sem este será preso como crime inafiançável.
Quanto às munições, segundo o estatuto do desarmamento, a comercialização só poderá ser efetuada em estabelecimento credenciado pela polícia federal e pelo comando do exército, que manterão um cadastro dos comerciantes.
Paralelo ao estatuto e à campanha do desarmamento (voluntário), surge uma movimentação política, ideológica e financeira para a realização de um referendo que ocorrerá no próximo dia 23 de outubro de 2003, que valerá como uma eleição normal. A questão consiste em saber da população se ela é ou não a favor da proibição da comercialização de armas de fogo e munição no território nacional.
Todas essas medidas não só são questionáveis, como também o próprio referendo se faz ineficaz quando se abstém de incutir na sociedade a reflexão sobre a relação da violência com a sociedade, da sociedade com o Estado e do Estado com a violência e suas responsabilidades e deveres quanto a essas questões.
As campanhas SIM e NÃO são, evidentemente tendenciosas e não seria injusto dizer que a primeira não só omite dados importantes como também é altamente manipuladora. Mas, independente das posições escolhidas por ambas, a população deve saber, antes de tudo, que enquanto o Estado não pode garantir que não haverá violência por parte do grupo marginalizado, não pode tirar o direito do cidadão de se defender. Além disso, é claramente injusto que o Estado justifique todas essas ações como medidas relevantes para diminuir a violência, colocando cidadãos no mesmo patamar que um criminoso altamente perigoso.
O referendo mais se configura como forma de jogar a obrigação básica do Estado de manter a segurança nas mãos do cidadão, do quê fazer com quê o cidadão se torne mais consciente e político quando um mínimo debate plausível sobre o assunto não é realizado.
É preciso lembrar que, não obstante, a proibição fere o direito de legítima defesa, o direito de ir e vir, o princípio da liberdade e da igualdade, todos garantidos pela constituição. É preciso refletir, antes de tudo, sobre o direito e autonomia de cada brasileiro sobre suas próprias decisões. É preciso refletir, afinal de contas, no direito de quem estão mexendo, para quê e para quem?
“O burguês é, pois, segundo sua natureza, uma criatura de impulsos vitais muito débeis e angustiosos, temerosa de qualquer entrega de si mesma, fácil de governar. Por isso colocou em lugar do poder a maioria, em lugar da autoridade a lei, em lugar da responsabilidade as eleições.” Hermann Hesse. O Lobo da Estepe. 49, 50 p.

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